CARTAS AS ANTEPASSADAS

CARTAS AS ANTEPASSADAS

Ah, se vocês pudessem me ver aí de cima. Se pudessem ver tudo que está acontecendo aqui, vocês não iriam acreditar nas mudanças que estamos vivenciando.

Tataravó, você que foi indígena, raptada e obrigada a se casar com um homem de outra cultura, ficaria sem palavras ao ver que hoje temos muitas de você sendo representadas na política aqui no Brasil. Hoje as indígenas ocupam cargos importantes e foram escolhidas pelo povo.

Aliás, bisas, agora nós já podemos votar! Sim, temos direito de escolher quem queremos como governantes. Vocês conquistaram esse direito e nós honramos essa luta.

Vou contar ainda mais, hoje temos conta bancária que podemos abrir sozinha, pois já temos também nossos CPFs. A minha conta bancária, queridas antepassadas, eu abri ainda adolescente quando comecei a trabalhar e gerar meu próprio dinheiro.

E tem mais, minhas avós! Sei que o sonho de vocês de pequenininhas era ter estudado. Tanto que você, querida vovó, escolheu meu segundo nome, Zuleide, pois admirava a filha do fazendeiro que era a professora da fazenda que nossa família trabalhou quando você era somente uma criança. Sobre isso, somos a maioria no banco das universidades! Sim, estamos ocupando lugares que vocês imaginaram um dia. Estamos produzindo muita ciência, escrevendo muitos livros e sendo reconhecidas por isso. Após tantas décadas ainda nos deparamos com mulheres que viveram aí, junto de vocês, sendo reconhecidas por sua arte, por sua ciência e por sua política.

Eu vejo todas vocês e honro o fato de estar aqui vivenciando o resultado de tudo que vocês fizeram. Estou colhendo muitos frutos. Vocês assumiram papéis que foram pesados demais e nos ensinaram que deveríamos ter a mesma postura rígida, cuidadora, salvadora e guerreira. Mas hoje queridas antepassadas, essa postura está nos adoecendo. Por vezes observei vocês cuidando de todos e de tudo, menos de vocês mesmas e por vezes também me peguei repetindo o mesmo padrão. Em outros momentos acreditei que precisava bater no peito, afirmar que sou guerreira e ir à luta com toda a energia masculina, e me esqueci que meu corpo poderia sucumbir como o de vocês. Sim, isso foi necessário, por vezes o homem não pode estar ao lado para dividir as tarefas. Mas agora é diferente. Agora eles estão aqui e cada um pode ocupar o seu lugar na relação. Nós podemos pedir ajuda a eles com amorosidade e no final ainda agradecemos. Alguns homens estão confusos com todas essas mudanças, mas o que eu digo as mulheres “primeiro se entendam, depois diga a eles o que está acontecendo. Se nem você mesmo se entende, como pode querer com seu parceiro te entenda?”.

Agora eu não preciso mais acionar o 4×4 e passar por cima de mim mesma. Por cima das minhas necessidades básicas que sustentam minha saúde física, mental e emocional. Agora é mais leve, graças a vocês! Nesse momento já percebo quando estou copiando o comportamento de vocês, por amor e lealdade inconsciente, mas um amor que pode adoecer.

Hoje eu não quero mais ser guerreira como vocês foram, hoje eu quero ser sábia e próspera. Hoje eu honro meu corpo, esse templo sagrado que me conduz pela vida e que chegou até mim graças a tudo que vocês fizeram.

Hoje nós podemos muito mais. Podemos chegar mais longe em nossas carreiras, podemos escolher se queremos nos casar, se queremos ter filhos, se queremos estudar em outro país ou se queremos ter uma empresa. Hoje nós podemos muito mais.

Então, em reverência a todas vocês que vieram antes de mim, minha mãe, minhas avós, bisas, tatas, pentas, etc. Eu agradeço a vida que veio de tão longe, agradeço por tudo que vocês fizeram para darem conta, pois vocês fizeram o suficiente, e peço licença para seguir com mais leveza com aquilo que herdei de vocês, mas tendo a liberdade para fazer um pouco diferente.

Deixo com vocês o que é de vocês e sigo com aquilo que é meu. Em honra a todas vocês eu afirmo que sou amável comigo mesma, que cuido da minha mente, da minha alimentação, que sou próspera e feliz. Em honra a vocês eu entro em equilíbrio com meu feminino e aceito tudo que foi do jeito que foi, pois não tenho como mudar o passado, mas posso começar a mudar meu presente para ter um futuro extraordinário.

E você também pode transformar a sua vida por meio do entendimento da linhagem de mulheres do seu sistema familiar. Comece pesquisando a história de vida de suas antepassadas e tome essa força ancestral em você.

Leticia de Lima é bióloga, mentora de mulheres e palestrante. Mestre em ensino pela UFABC e Consteladora Familiar. CEO da Vida Educação Sistêmica e idealizadora do projeto Amazônia para o Mundo.

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